sábado, 2 de março de 2013

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(escrevi para o ornitorrinco #27, lembrei porque ontem andei em frente ao colégio militar, mas só à noite percebi a coincidência das datas, foi tudo 2 de março)




Um dia eu fui expulsa do colégio militar. Eu não era aluna, calma. Eu tinha 14 anos e ia ter uma matinê no colégio. Um primo estudava lá e avisou. Eu fui com um saião horroroso até o pé, meio crente. E um blusão com uns anjos em quase alto relevo fofinho. Uma verdadeira desgraça. Fase anjos. Toda menina teve. Depois vem fase Índia e coisas bem mais constrangedoras, mas enfim. Eu tinha feito ginástica olímpica no colégio militar dos 6 aos 9, eu não era boa, mas eu estava fugindo da professora russa de balé, e pelo menos ali eu podia dar cambalhota e estrela e ninguém me dizia que eu não seria graciosa na minha vida. Poderiam pensar, mas não cuspiam sotaque russo na minha cara.

Eu sabia que do lado da quadra, tinha um bebedouro.

Então quando naquela noite de matinê (nem tanto matinê pois meu pai só nos buscaria 2 da manhã), eu, minha prima Marina, meu primo Ernani (que estudava lá), e uns outros perdidos, estávamos com sede e a água era muito cara, eu disse muito certa do que poderíamos fazer: beber água do bebedouro do lado da quadra.

Só que isso era longe. O bailezinho estava rolando num lugar e a quadra era longe, a gente andou no breu do colégio. Chegamos, bebemos água e um guarda chega do nada, causando até susto e diz tipo em cena de filme ruim: "PARADOS!" A gente nem bebia ainda ou usava outras substâncias mas a gente era bobo e qualquer aventura nos fazia rir. Caímos no riso frouxo. Como assim PARADOS? O guardinha insistiu e disse coisas do tipo: "Vocês invadiram uma área protegida, BLABLABLABLA" Não lembro ao certo. Sei que ele nos expulsou. Isso era uma época em que alguém ainda estava inventando o celular. Logo, não poderíamos avisar a outra parte da cambada que foi junto: meu irmão, minha outra prima. Expulsos. Tentamos argumentar, mas eles não eram desse tipo de gente que ouve, fala, ouve, fala. Eles só gritavam.

Militares. Meu primo que estudava lá, ficou calado. Claro. Mandou bem, poderia ser expulso do colégio, o que pra mim seria maravilhoso, mas pra ele nem tanto.

Pobrezinho.

Marina, minha prima, tinha então 15 anos e do lado de fora, gritava: "Muito engraçado, amanhã na página d'O POVO (era o nosso Meia Hora da época) vai estar escrito ALUNOS EXPULSOS DE FESTA PORQUE BEBEM ÁGUA, é isso mesmo que vocês querem pra sua instituição???". A Marina era assim. Na guerra do Golfo, pulou tanto de felicidade com o acontecimento que quebrou o pé nas ruas de São Pedro D'Aldeia. Ela era fogo. Ela era virgem, mas ela era fogo. Eu achava aquilo lindo, ela gritar aquelas coisas, do lado de fora da grade. Eu acho até que eu imitei. Os guardas nem olhavam no nosso rosto. A rua deserta, a gente sem celular, meu pai ou meio tio só nos buscariam em 2 horas, a gente não podia nem entrar de volta rapidinho pra avisar aos que ficaram, não deixaram. Caos. Mas aventura. Aventura. Mas aí não lembro mais. Tento e não consigo.

Acordei no dia seguinte e os Mamonas Assassinas tinham morrido, todos. Fiquei muito triste. Liguei pra Marina. Ficamos muito tristes.

Esse texto não tem sentido. É só porque sempre tive PREGUIÇA de redigir essa história pro futuro desmemória que talvez chegue. Já chegou, já perdi bons detalhes. Enquanto ficamos as duas horas na calçada esperando, aconteceram coisas. Coisas livres, pois nunca ficávamos na rua aquela hora. Mas eu esqueci. A preguiça do relato me fez esquecer. "Depois eu escrevo, está tudo aqui dentro". Mas fugiu. Escapou. Dei mole. Dei duro. E quando alguém morre, a gente só quer rasgar o cérebro pra resgatar qualquer coisa que nos acenda a lâmpada do "ufa, lembrei".

Que saudade da minha prima.

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