segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

meu texto sobre tempo livre pro ornitorrinco

Com 10 anos, na festa de reveillon na casa dos meus pais, tive uma epifania absoluta. Fugi da festa e me tranquei no quarto aos prantos, pensando: "TODO MUNDO VAI MORRER". Ainda não tinha batido essa real. Uma prima apareceu, me confortou um tiquinho, e até consegui entrar na piscina duas da manhã, de vestido branco, achando aquilo uma grande anarquia. Enquanto nadava, já sorrindo e parecendo ter 10 anos de volta, pensava: "TODO MUNDO VAI MORRER".

Isso, pra dizer que no tempo livre que a vida me oferece, que é ele todo, pois mesmo trabalhando ou na fila de um banco, sinto liberdade no ato, penso muito na morte. Não tenho tendência suicida e não faço uso de remédio algum para poder/conseguir sobreviver. Mas sim, penso muito, MUITO na morte. Em como as pessoas que gosto vão morrer, quando, de que maneira, e eu mesma, claro. O elevador demora, eu penso numa morte nele. Um ônibus passa voando, e se ele levasse a senhorinha que anda na calçada? O corpo dela, a vida dela. Visualizo. Eu no carro. Eu dormindo. Dentro do meu cérebro. O telefone tocando. Dessa vez sua vó se foi. Ou foi fulana, minha amiga mais nova? Eu tropeçando, eu descobrindo ser podre por dentro. Avião caindo, pequenos acidentes, só que com o azar de serem mortais. Sempre, sempre. Não me consome. Não sofro com isso. Não dura muito. Minha vida é desregrada de horários. Acaba um show, posso chegar em casa e peidar ou posso ter audácia contra o cansaço e pegar o violão e tentar compor. E isso ainda é tempo livre. Também, também. Mas não há um dia da minha vida que não pense na morte. E soube por amigo querido que sofre do mesmo mal, que os xamãs pensam na própria morte de diferentes maneiras todo dia da vida. E que essa consciência e visualização traz força. O delírio nos sobrepõe, a gente voa, brinca de viver e é claro que amanhã a gente acorda e faz tudo isso de novo. Já estive lá, mas agora quis assumir essa ideia fixa com a morte e sabem as deusas se isso me trará a tal força xamânica ou não.

Fora isso, continuo devorando bertalha com ovo, fazendo mais de 2 shows por semana, entregando à pele protegida ao sol, observando muito meu corpo e do homem que se propõe ficar nu pra mim. Tenho lido bastante, gente louca, gente viva, poesia, devaneio, bastante coisa. Tenho feito muitos planos, sem grande ansiedade, conhecido um pessoal bacana, e não "bacana" dos anos 80, onde isso significava riqueza, meu bacana é de riqueza fonética, labial, gostosura mental, abraço nem tão apertado que incomoda, nem tão frouxo que sugestiona. Tá tudo bem, tudo agitado e calmo, olho do furacão, olho de um bebê que nasceu, e ainda assim, a morte sempre aqui do lado, presença que exclama: OPA.

Eu, devota da vida, abaixo a cabeça cerimoniosamente quando sei que ela está por perto. Medo algum, apenas curiosidade e respeito. E infinitas mil possibilidades. De permanência e de liquidação.

Enquanto isso.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

vox

resumindo muito, sendo péssima nisso, mas fazendo questão do relato: tenho fenda nas cordas vocais. videolaringoscopia acusou e me causou um desconforto mór. depois vi beleza, vendo o dvd da filmagem. a garganta é pura vulva, buceta pura, depiladinha, hahahaha, hilário, brasil. o corpo dentro, tão bonito, tão vivo. vez ou outra penso em me cortar ou me rasgar, zero tendência suicida, é mais pela curiosidade do dentro. mas claro que não. claro que nunca.
daí vou fazer fono, fui hoje até. casal que trabalha junto com isso. bizarríssimo. curioso. o carnaval tem levado minha voz embora. os meninos trocam cordas, eu fico rouca, entregue a um lugar que não é meu. agora vamos torcer pra dar certo. pra tudo ficar nos conformes. e pra eu ter 67 anos ainda com voz boa. dedos cruzados. corpo cruzado.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

3.0

últimos dias da década de 20 pra mim. logo, farei a idade que me dão há 10 anos. então, talvez, tudo ficará certo. o peitinho já foi mais bonito, já foi mais metido, mas lucas continua colocando tudo na boca com muito gosto, mas sendo mulher, sou meio lésbica comigo mesma, me apaixono e desapaixono por mim mesma várias vezes. fases de me encantar com meu colo, fases de morrer ao encarar minha bunda no espelho. oh, scarlet, eu jamais poderia fazer uma foto assim.
sendo a sorridente que sou, a pele em volta dos olhos começa a formar estrelas já. sem falar nas varizes, verdadeiros mapas de rios que passeiam sem dó pelos meus pés, pernas e até mesmo nas faces. sendo grata ao universo, fico feliz com o básico, as duas mãos, a visão, a audição, minha quantidade de eloquência, minha tendência a discrição, mesmo sendo hiperbólica, em tamanho e coração. agradeço lucas, como eu mesma disse num ritual maluco de ano novo feito com pouquíssimos queridos: XERECA AO CÉU. disse isso pra agradecer. todos riram. eu ri também, claro. foi um momento íntimo e engraçado e de agradecimento.
ninguém me perguntou a idade esses dias, talvez sinta saudade de dizer "29", talvez não. não mais do que sinto saudade de só mostrar a mão. a mão inteira.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

troncha

deu tudo certo, mané retorno de saturno o quê, brasil, correu tudo bem. mentira. se você pergunta isso pro lucas, ele diz: CAÔ. pra ele não, porque daí o mergulho é profundo, garganta, corte, tudo profundo. teve essa noite da iluminação, que eu disse olhando na cara dele, chorando, porque estava emocionada, comovida de pensar aquilo, eu disse:"eu estou muito feliz com os lugares que eu tenho chegado na minha cabeça". ele ficou muito feliz e disse que queria ser um neurônio meu só pra saber melhor whatthefuck. essa noite de iluminação, que eu saí, vi de fora, voltei, sosseguei o facho, o cerebelo, os demônios sempre preparados nos ouvidos, sossegay, queria escrever melhor, claro. sempre. óbvio. até porque foi um lance muito forte, minha cabeça chegou num lugar que ainda nunca. mas passar é difícil. eu tô fazendo só pra ter 67 anos e reler e pensar: "lembra dessa noite, caslu?" ele talvez diga não, mas eu vou ter chegado n'outro lugar. e não vou me importar.

domingo, 20 de novembro de 2011

Saturnina

Tenho 9 anos e está na moda ter caderno de perguntas. Com sorte, o Rodrigo Barbosa vai responder, e eu vou saber um pouco mais sobre ele. Na minha rua quase não passa carros, as pessoas brincam de tudo. Vôlei, taco, bonecas e os mais adolescentes (eu tinha HORROR à tal palavra) ficam só de papo na calçada.
A primeira pessoa a responder meu caderno de perguntas foi minha vó Marphisa. Ler hoje em dia é quase morrer de rir. Ela já era senhora e respondia senhoramente.
Estava na moda responder caderno de perguntas, as pessoas se sentiam importantes. Sendo assim, meu caderno caiu nas graças dos adolescentes da rua. Esses não me zoavam, fui muito feliz na rua. No colégio é que a coisa foi mais complicada.
Quando o caderno foi devolvido, fui ler curiosa. Nomes que eu até então só sabia quem eram de longe.
Eu tinha 9 anos, um pouco de audácia, mas eu tinha 9 anos. Pense.
Uma das perguntas era: "Um país bonito? Um planeta?"
A primeira era sempre respondida. "França, Itália, Brasil" ganhavam, creio eu. Já pra segunda, fui bem ridicularizada:
"Só conheço a Terra, querida, e você?" ou "COMO ASSIM PLANETA BONITO, TÁ LOUCAAAA?"
A última pergunta do caderno era: "Faça uma pergunta pra mim"
Uns foram fofos, outros atacaram: "Qual planeta você vive?" ou "Quando for pra outro planeta, me chame, tá?" De 22 pra baixo.
Não cheguei a ficar ofendida, porque eu realmente era muito distraída na infância, foi o colégio que me deixou vez ou outra com idéia fixa e mania persecutória. Minha essência é distraída. Portanto não me ofendi, mas fiquei com pena deles, que só conheciam um planeta.
Obrigada, mamãe.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Just in case

Se liga> sonhei que colocava música no microscópio. Calma, antes eu estava numa praia de água transparente, meu brit-sobrinho comigo. Eu dizia: "Passa a mão na estrela do mar, Rafi", ele respondia "Não, tia!", doido. Aí depois é que eu colocava música, não sei como, perdão, no microscópio, rolavam mil colcheias, sabe colcheia? Era meio como o céu negritude de lugares afastados, só estrelas, umas nebulosas e puro preto bonitão. DEVE SIGNIFICAR MEU ESTREITAMENTO COM A MÚSICA, TÔ VENDO MELHOR, MAIS DE PERTINHO. Ou não. É uma pena que o "ou não" já é tão do Caetano. Saco. Hoje ouvi "quereres" e chorei. Mandei pro Lucas. É de viés.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

a malvada (all about eve)





cheiro

cheiro de boceta atrai homens e animais também.
esqueci um biquini usado e mezzo lavado pendurado na janela. preguiça de lavar no tanque, acabei só passando uma água e deixei pra depois.
hoje foi depois, e quando entrei no box do chuveiro, várias formigas comiam meus restinhos de ovulação. de onde surgiram tão rápido? moro no sexto andar. foi lá debaixo? foi de dentro das paredes?
um mini tiny weenie narizinho de formiga consegue sentir um resto mortal de algo que não fecundou, mas tem cheiro de possibilidade.
homens e formigas sentem esse cheiro. de possibilidade.



segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Sylvia Plath (dos favoritos)

Elm

I know the bottom, she says. I know it with my great tap root;
It is what you fear.
I do not fear it: I have been there.

Is it the sea you hear in me,
Its dissatisfactions?
Or the voice of nothing, that was you madness?

Love is a shadow.
How you lie and cry after it.
Listen: these are its hooves: it has gone off, like a horse.

All night I shall gallup thus, impetuously,
Till your head is a stone, your pillow a little turf,
Echoing, echoing.

Or shall I bring you the sound of poisons?
This is rain now, the big hush.
And this is the fruit of it: tin white, like arsenic.

I have suffered the atrocity of sunsets.
Scorched to the root
My red filaments burn and stand,a hand of wires.

Now I break up in pieces that fly about like clubs.
A wind of such violence
Will tolerate no bystanding: I must shriek.

The moon, also, is merciless: she would drag me
Cruelly, being barren.
Her radience scathes me. Or perhaps I have caught her.

I let her go. I let her go
Diminshed and flat, as after radical surgery.
How your bad dreams possess and endow me.

I am inhabited by a cry.
Nightly it flaps out
Looking, with its hooks, for something to love.

I am terrified by this dark thing
That sleeps in me;
All day I feel its soft, feathery turnings, its malignity.

Clouds pass and disperse.
Are those the faces of love, those pale irretrevables?
Is it for such I agitate my heart?

I am incapable of more knowledge.
What is this, this face
So murderous in its strangle of branches?--

Its snaky acids kiss.
It petrifies the will. These are the isolate, slow faults
That kill, that kill, that kill.


Olmo

Sei o que há no fundo, ela diz. Conheço com minha própria raiz.
Era o que você temia.
Eu não: já estive lá.

É o mar que você ouve em mim.
Suas frustrações?
Ou a voz do nada, essa é sua loucura?

O amor é uma sombra.
Como você chora e mente por ele.
Ouça: estes são seus cascos: fugiram, como cavalos.

Vou galopar a noite inteira assim, impetuosa,
Até que sua cabeça vire pedra, seu travesseiro vire turfa,
Ecoando, ecoando.

Ou devo te trazer o borbulhar das poções?
Isso agora é chuva, esse silêncio imenso.
E este é seu fruto: branco-metálico, como arsênico.

Sofri a atrocidade dos poentes.
Queimada até as raízes
Meus filamentos ardem e ficam, emaranhados de arames.

Meus estilhaços se espalham em centelhas.
Um vento violento assim
Não suporta obstáculos: preciso gritar.

A lua, também, não tem pena de mim: me engole
Cruel e estéril.
Seus raios me arruínam. Ou quem sabe a peguei.

Eu a deixo ir, ir
Magra e minguante, como depois de uma cirurgia radical.
Seus pesadelos me enfeitam e me possuem.

Dentro de mim mora um grito.
De noite ele sai com suas garras, à caça
De algo pra amar.

Sou aterrorizada por essa coisa negra
Que dorme em mim;
O dia inteiro sinto seu roçar leve e macio, sua maldade.

Nuvens passam e se dispersam.
São estas as faces do amor, pálidas, irrecuperáveis?
Foi pra isso que agitei meu coração?

Sou incapaz de mais compreensão.
E o que é isso agora, essa face
Assassina em seus galhos sufocantes? -

O beijo traiçoeiro da serpente.
Petrifica o desejo. Esses são os erros, solitários e lentos,
Que matam, matam, matam.